Em uma de minhas visitas à cidade de Bauru, tive o privilégio de assistir a um belíssimo concerto da Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo (OSESP), ouvindo pela primeira vez o Bolero de Ravel.
A pedido da dançarina russa Ida Rubinstein, Maurice Ravel tinha em mente transcrever para orquestra a música ibérica, composição de seis peças para piano escrita pelo compositor Isaac Albeniz. Enquanto amadurecia a sua ideia, Ravel foi informado que o maestro espanhol Enrique Fernández Arbós já havia feito uma orquestração das mesmas peças. Apesar de receber a permissão e os direitos para continuar o seu trabalho, o compositor francês mudou seu pensamento e decidiu escrever uma nova música, inspirado pelo ritmo da dança espanhola, o bolero.
Enquanto passava suas férias em Saint-Jean-de-Luz, Ravel sentou-se em um piano, e tocando uma melodia com um dedo, comentou com seu amigo Gustave Samazeuilh, que aquele tema tinha uma qualidade insistente, e que iria trabalhar naquela repetição, inserindo gradualmente os instrumentos da orquestra. O compositor então deu inicio a sua composição em julho, terminando cinco meses depois, entregando nas mãos de Ida Rubinstein para que ela a coreografasse. O espetáculo do compositor e da famosa dançarina teve a sua primeira apresentação no dia 20 de novembro de 1928, na Ópera de Paris, recebendo vários prêmios naquela ocasião.
O Bolero de Ravel é uma música repetitiva, riquíssima na exploração dos timbres de todos os instrumentos da orquestra. Em seu início, apenas uma caixa, que mostra ao ouvinte o ritmo do bolero, seguindo até o final da música. Nesse ostinato (ritmo sem variação), os instrumentos vão entrando um por um em um pianissimo (volume baixo), ganhando a cada repetição massa e corpo, criando forma e volume, até chegar a um fortissimo (volume alto) apoteótico, encerrando a obra em uma atmosfera hipnotizante.
Não estava em Paris quando apreciei a obra pela primeira vez, mas ao caminhar pelas ruas frias de um inverno rigoroso em Bauru, me fez pensar que Ravel conseguiu naquela noite de 1928 fazer com que todos ali presentes voltassem para casa cantarolando a melodia inesquecível da obra que marcaria a sua vida.
Prepare uma bela xicara de café e se deliciem com as infinitas possibilidades sonoras exploradas por Maurice Ravel!